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segunda-feira, 9 de agosto de 2010

QUEM ENSINOU NOSSOS ATLETAS A JOGAR FUTEBOL? COMO AS CRIANÇAS APRENDEM (ou deveriam aprender) HOJE?


QUEM ENSINOU NOSSOS ATLETAS A JOGAR FUTEBOL?
COMO AS CRIANÇAS APRENDEM (ou deveriam aprender) HOJE?

Texto publicado no site Universidade do Futebol
http://www.cidadedofutebol.com.br/


Para respondermos (você leitor e nós, autores desse texto) a essas perguntas, apontamos no texto outras às quais ora serão por nós respondidas, ora você leitor poderá respondê-las. Segue o texto.
É bem conhecido de todos a ciência do comportamento chamada construtivismo, a qual aponta que para se aprender algo é necessário que a pessoa esteja em contato com o que se quer aprender. Mas quando falamos em futebol, atualmente, falamos em escolinhas de esportes e então falamos em pelo menos duas pessoas em ação, o aluno/atleta e o professor/técnico. Entretanto, será que a presença desse professor/técnico “garante” a aprendizagem dos alunos/atletas?
A resposta é simples: “Não garante, mas pode facilitar!”. Como nos coloca Paulo Freire, ninguém ensina nada a ninguém, o professor (considerar nesse texto também técnico) deve agir como um facilitador do aluno (considerar também atleta), ou seja, aquele que auxilia o aluno a aprender, possibilitando-lhe um ambiente com estímulos interessantes e condizentes com aquilo que se quer ensinar.
Então isso significa que excelentes atletas, (entendendo excelentes como sinônimo de habilidosos ou inteligentes taticamente) como Garrincha, Pelé, Ronaldinho Gaúcho e Robinho, tiveram facilitadores em suas aprendizagens. Então quem foram estes? Seus técnicos? Seus companheiros de time? Como se dá aprendizagem de um atleta? O que é tão importante para se tornar um atleta inteligente para o jogo?
Deixaremos essas questões para você leitor responder. Mas faremos alguns apontamentos que podem ajudá-lo a pensar sobre isso. Para tanto, iremos explicar o que significa ensinar e aprender e como se deve ensinar futebol atualmente.
Quando uma criança está aprendendo a jogar futebol numa escola de esportes ou num clube de futebol, temos a presença de um professor ou do “professor” como eles costumam chamar aquele que “os ensina”. Até aí nenhuma novidade. Mas, quando falamos de ensino aprendizagem, falamos necessariamente de Pedagogia, uma das ciências mais antigas da humanidade que surgiu com nossos antepassados gregos com o nome Paidéia. Desde aquela época seu significado deriva de sua função, ou seja, Pedagogia é uma ciência que não se refere única e exclusivamente ao modo como se ensina, à metodologia de ensino, mas reflete sobre o contexto que envolve a ação educativa, resultando numa prática de intervenção comprometida, intencional, dirigida, organizada e ciente de suas responsabilidades (ARANHA).
E a Pedagogia no futebol, o que esta significa?
Para o ensino dos esportes, ou para a Pedagogia do futebol, de acordo com Jorge Olimpio Bento, precisamos primeiro entender que o esporte é pedagógico e por conseqüência educativo, quando, entre outras coisas, proporciona obstáculos, exigências, desafios para se experimentar, observando regras e lidando corretamente com os outros.
Mas ensinar não significa “apenas” entender o que é pedagogia, mas entender o que significa ensinar, e para isto Paulo Freire destaca algumas responsabilidades, obrigações e princípios, quando aponta algumas exigências do ensinar, dentre as quais citaremos algumas:
- (ensinar exige) rigorosidade metódica;
- (ensinar exige) pesquisa;
- (ensinar exige) respeito ao saberes do educando;
- (ensinar exige) aceitação do novo e rejeição a qualquer forma de discriminação;
- (ensinar exige) reflexão crítica sobre a prática;
- (ensinar exige) respeito à autonomia do ser do educando;
- (ensinar exige) bom senso;
-(ensinar exige) a convicção de que a mudança é possível.

Podemos então perceber que, ao ensinarmos, em particular, esportes, devemos entender essa ação impregnada por diversos princípios e condutas pedagógicas, pois, sob a ótica do conceito ensinar não existe diferença entre o ensinar futebol (esportes) e ensinar português (ou qualquer outro conhecimento). Portanto, quando ensinamos algo a alguém o mais importante é sabermos que todos somos inteligentes, capazes de crítica e de capacidade in-determinada.
Mais difícil do que saber o que significa ensinar é saber o que significa aprender, ou seja, como, por que e o que cada um aprende.
A aprendizagem é estudada por diversas ciências, mas a Educação e a Pedagogia fizeram uma importante associação quando começaram a desenvolver os estudos na área da Psicologia da Educação. Nesta área têm surgido diferentes estudos sobre o que significa aprender, isto é, estudos que buscam explicar o complexo processo pelo qual as formas de pensar e os conhecimentos existentes numa sociedade são dominados por uma pessoa (DAVIS e OLIVEIRA).
Contudo, só podemos saber se um aluno aprendeu se o avaliarmos. No esporte tem-se o hábito de avaliar os alunos pela observação de sua habilidade motora, o que pode ser um erro, pois ao demonstrar uma habilidade, o aluno pode estar repetindo um gesto que sabe fazer, mas isso não significa que ele também saiba quando utilizá-lo e porquê.
Mas qual a importância dessa discussão nesse momento? O importante não é um atleta habilidoso, inteligente, inteligente taticamente?
Vamos começar a explicação retornando aos nossos exemplos. O que fez com que Garrincha, Pelé, Ronaldinho Gaúcho e Robinho, por exemplo, além de tantos outros, fossem considerados excelentes atletas em suas épocas? Seria executarem as habilidades do futebol melhor do que outros atletas? Seria jogarem como atacantes, num país que valoriza mais quem faz um gol do que quem defende? Mas e os outros atacantes, por que não são considerados tão bons quanto eles?
Acreditamos que esses atletas não aprenderam a jogar futebol nas escolas de esportes, pois na época em que aprenderam as crianças jogavam futebol nas ruas, nos clubes, na praia, em qualquer lugar, e não apenas nos clubes, como ocorre com muitos atletas hoje. Quem é contemporâneo desses atletas, sabe que em qualquer espaço vazio em que se tem uma criança e a vontade de jogar futebol, basta algo para se chutar, como uma lata velha, uma laranja jogada ao chão ou mesmo uma bola, a mais tradicional companheira, que o jogo já é possível. Quantos de nós já presenciamos crianças jogando futebol em diferentes espaços, que não eram necessariamente um campo de futebol, principalmente nas periferias das cidades. Jogar futebol no Brasil sempre foi uma brincadeira prazerosa, que culturalmente agrega muitas crianças, principalmente pela acessibilidade que proporciona aos mais carentes financeiramente.
Então, se esses atletas aprenderam a jogar futebol, ou aprenderam a desenvolver sua inteligência tática para o futebol nas ruas, o que os clubes esportivos, atuais entidades responsáveis pelo ensino esportivo dessas crianças que não podem mais sair das suas casas por causa da violência que nossas ruas representam, devem fazer? Como conseguir nos clubes aquilo que a rua possibilitava aos atletas: desenvolver talentos esportivos?
Também fica difícil acreditar que exista uma fórmula única, inteligente ou milagrosa de se fazer atletas habilidosos, de se criar ídolos. Não se pode negar que os atletas mais habilidosos têm algumas características que por si só conseguiram desenvolver mais do que os outros atletas, e por isso, a responsabilidade de um atleta ser mais inteligente para o jogo do que outros atletas não é única e exclusiva do técnico, mas de cada agente desse ambiente de aprendizagem. No entanto, os estudos na área das Ciências dos Esportes apontam para uma aprendizagem empírica desses atletas. Ou seja, não temos dados que apresentem como foi o processo de ensino aprendizagem aprendizado desses excelentes, mas sabemos que a aprendizagem foi rica em atividades, brincadeiras, jogos, diversão com a bola nos pés, e esse é o grande segredo de um atleta inteligente, a diversidade, pois o jogo exige ininterruptamente a criação de possibilidades de gol, de defesa, de passes, de cortes, enfim de intervir de maneira eficaz para se resolver os problemas postos e para se criar situações de superioridade tática!
Atualmente, a dificuldade dos clubes para ensinar esse atleta, que não jogou nas ruas, é ter uma proposta de ensino pautada apenas em conhecimentos técnicos, sem uma correspondente reflexão. Um ensino que se caracteriza por ser bancário , depositário, como dizia Paulo Freire, que, quando aplicado ao esporte, treina o atleta no desempenho de habilidades motoras, sem permitir-lhe o desenvolvimento e a possibilidade de assumir uma capacidade crítica, inteligente, responsável, sobre o conteúdo ensinado.
Portanto, pedagogicamente pensando, o que significa ensinar esporte?
O que deve ser ensinado é: além do aprendizado do jogo em si e de seus fundamentos dentro do seu contexto, a aquisição de condutas motoras (ampliando-se o repertório de possibilidades de respostas para os jogos), e o entendimento do esporte como um fator cultural (por conseqüência, humano), estimulando sentimentos de solidariedade, cooperação, autonomia e criatividade (SCAGLIA e SOUZA). Mas tudo isso só facilitará o atleta se desenvolver inteligente se for dado a ele diversidade de criação. Entendendo criação não como repetição de movimentos ou jogadas, mas a repetição de situações, treinos nos quais ele é responsável pelas suas condutas de criação, de resolução de problemas. Para os menos observadores, é preciso possibilitar aos atletas que cresçam jogando futebol com o mesmo espaço de criação que as crianças os fazem nas ruas, sem técnico. A diferença deve ser o conhecimento do técnico e de sua comissão sobre como as brincadeiras, os pequenos, médios e grandes jogos facilitam o desenvolvimento da inteligência do ser humano!

Referências bibliográficas

ARANHA. M. L. de A. História da educação. 2a. Ed. São Paulo: Moderna, 1996.
BENTO, J. O. Novas motivações, modelos e concepções para a prática desportiva. In: BENTO, J. O. (Org.) O desporto do século XXI: os novos desafios. 1991.
DAVIS, C.; OLIVEIRA, Z. Psicologia na educação. 2ª. Ed. São Paulo: Cortez, 1994.
FREIRE, P. Pedagogia da autonomia: saberes necessários à prática educativa. 2 Ed. São Paulo: Paz e Terra, 1996.
SCAGLIA, A. J., SOUZA, A. J. Pedagogia do esporte. In: COMISSSÃO DE ESPECIALISTAS MINISTÉRIO DOS ESPORTES. Pedagogia do esporte. Brasilia: CEAD/UNB, 2004.

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